Relatividade: constante cosmológica X energia escura
- Pedro
- 23 de jan. de 2021
- 5 min de leitura
Atualizado: 26 de jan. de 2021
Apesar da astronomia ser uma das ciências mais antigas e estudadas, no início do século XX pouco se sabia sobre cosmologia, campo de estudo envolvendo as “grandes questões”, como qual o formato do universo, como ele se comporta em grandes escalas, qual foi sua origem, etc. Portanto, antes de Edward Hubble ter feito sua descoberta da expansão do cosmos, acreditava-se que o universo era estático (seu tamanho não mudava), tal qual a visão de Immanuel Kant no século XVIII. A revolução no campo da cosmologia viria mais tarde, em 1915, com a publicação da relatividade geral por Albert Einstein. Ainda sim a relatividade geral tomou dez anos parra ser desenvolvida, sendo que Einstein teve diversas desventuras no caminho, tal qual o aparente colapso do universo. Caso você solte duas bolinhas de gude em uma pia com formato funil, o choque entre elas será eminente visto o trajeto curvo que elas devem seguir. Caso, de algum modo, a pia começasse a expandir de tamanho no momento em que você solta as bolinhas, a colisão seria dificultada ou até impossibilitada, dependendo de quão efetiva é a expansão. Como a teoria de Einstein compreende o espaço como uma geometria curvada por objetos massivos e/ou energia, o físico entendeu que o universo simplesmente colapsaria caso fosse estacionário, da mesma forma que o choque inevitável no lançamento das bolinhas. A única resposta seria se o universo estivesse em expansão, bem como a pia, mas como a descoberta de Hubble ainda não havia sido feita, Einstein optou por adotar um parâmetro de correção chamado “constante cosmológica”, denotado por Λ. Em outras palavras, a constante cosmológica tinha a função de “deletar” o efeito do colapso do universo.
Antes de entendermos mais sobre a constante cosmológica, é importante que tenhamos algum conhecimento sobre as equações de campo, base da relatividade geral.

Foto 1
Pode ser uma surpresa, mas a foto acima ilustra dezesseis equações, não uma. Isso se deve ao fato das entidades contendo os subescritos não serem escalares, nem vetores, mas tensores. Os subscritos µ e ν indicam as coordenadas espaciais e temporais, como mostrado abaixo.

Foto 2
Todavia, devido a possibilidade de iguais combinações de µ e ν, há seis equações que se repetem. Portanto, há dez equações de campo independentes. Veja abaixo as repetições:

Foto 3

Foto 4

Foto 5
Cada equação gerada é uma equação diferencial. Equações diferenciais são equações que têm derivadas na sua constituição. De forma simples, elas são construídas durante o estudo da variação de algum fenômeno, como a variação da velocidade, por exemplo. Ao resolvermos uma equação diferencial, obtemos uma função como sua solução (de forma semelhante quando encontramos o(s) “x” como solução de uma equação convencional). No caso de uma equação diferencial onde a derivada é referente à velocidade, temos a aceleração como solução. Além disso, equações diferenciais são capazes de nos dizer como o sistema considerado se comportará no futuro, tendo como partida tão somente as condições iniciais do sistema. Todavia, essas poderosas ferramentas matemáticas têm um custo: a constante de integração. Para resolvermos equações diferenciais temos que realizar o processo contrário das derivadas, que são as integrais. Ao realizarmos uma integral indefinida, obtemos sempre uma constante arbitrária cujo valor depende de outras técnicas para se determinar, isto é, quando é possível determina-lo. Como a relatividade nos fornece dez equações diferenciais independentes (que não se repetem), teremos um conjunto de constantes a se determinar. O problema é que, como dito, nem sempre a determinação de tais constantes é possível. Da mesma forma que o conjunto das equações geram a equação de campo generalizada (foto 2), o conjunto dessas constantes de integração geram uma “constante generalizada”, que é justamente a constante cosmológica.
Sabemos agora um pouco sobre as equações-mãe da relatividade, contudo, a questão permanece: se o universo realmente está em expansão, como demonstrado por Hubble, então o valor dessas constantes de integração/constante cosmológica deve ser zero, certo? Não necessariamente. Caso o valor seja zero, teremos um universo em expansão (o que condiz com as observações) ou em contração acelerada (diferente do colapso induzido pela gravidade mencionado no início do artigo). Caso Λ seja positivo, a expansão do universo seria acelerada e, caso Λ fosse negativo, a expansão do universo seria desacelerada. Note que o valor das constantes pode, literalmente, ser qualquer número como +0.00000000000001, ou -0,03432495, ou 0, ou qualquer outro, contanto que não tenha uma magnitude significativa, o que iria contrariar as observações do universo em expansão. O problema é que não temos como saber precisamente o valor de Λ, devido às incertezas (grau de erro) nas tentativas de medição. É como quando vamos medir a altura de uma pessoa. Podemos usar uma fita métrica, mas não vamos conseguir saber a altura com precisão milimétrica absoluta. Podemos acabar medindo uma altura um pouco maior ou menor do que a real. Esse erro é chamado de incerteza na medição. Desse modo, como espera-se que Λ seja um valor pequeno, praticamente qualquer incerteza já se mostra “catastrófica” (talvez maior do que o próprio valor de Λ).
Até agora falamos extensamente a respeito de Λ, mas nada sobre a energia escura. O que seria essa energia escura? A resposta é certamente merecedora de um Nobel. Ninguém sabe. É factual que ela exista, devido a seu papel notável na expansão do universo. Se não fosse por ela, o universo teria colapsado logo após o Big Bang devido à atração gravitacional do universo inteiro estar concentrada em um volume muito menor do que uma bola de tênis. A energia escura oferta “vitalidade” para a expansão do universo, a acelerando. Seria algo como uma “pressão negativa” onde a força é exercida para fora e não para dentro (causando expansão e não contração). Aqui já vemos uma semelhança entre a energia escura e a constante cosmológica positiva: ambas favorecem a expansão do cosmos.
A energia escura e a constante cosmológica, apesar de serem conceitos interligados à energia, diferem-se principalmente por onde a energia está atribuída. No caso da energia “convencional”, esta é ligada a sistemas físicos (sejam eles corpos, partículas...), como a energia dos fótons, a qual diminui conforme o universo expande devido ao desvio para o vermelho (já discutido aqui no artigo sobre "o universo inflacionário que se auto-reproduz") . No caso da energia escura e constante cosmológica, as “energias” são atribuídas ao espaço em si (e não nas entidades que nele está inserido).
Da mesma forma que há dificuldade na medição de Λ, há dificuldade na medição da energia escura. As incertezas na medição sugerem que a densidade da energia escura possa não ser constante, contrariando à “constância da constante cosmológica.” Contudo, dados mais apurados são necessários antes de qualquer afirmativa.
A distinção matemática entre Λ e a energia escura encontra-se abaixo:

Foto 6
Resumindo tudo o que foi dito, o principal ponto é: a energia escura pode ser o mesmo que a constante cosmológica Λ, mas não precisa ser.
Material de referência:
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